segunda-feira, 31 de julho de 2017

O tesouro

Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará

 Os grandes ideais encontrados na vida norteiam nossa existência, unificando-a e dando-lhe o élan que sustenta as decisões quotidianas. Quando faltam, torna-se difícil caminhar com segurança, provocando dispersão de nossas forças, com o consequente cansaço, tristeza, sensação de perda de tempo e frustração. Toda pessoa humana é convidada, mais ainda chamada, a mirar para o melhor e o mais perfeito! Soa sempre atual e provocante a palavra de São Paulo: “Se ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas do alto, onde Cristo está entronizado à direita de Deus; cuidai das coisas do alto, não do que é da terra. Pois morrestes, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, vossa vida, se manifestar, então vós também sereis manifestados com ele, cheios de glória” (Cl 3,1-4).
Uma das dificuldades existentes numa sociedade em que pessoas são discriminadas é julgar a muitos incapazes de grandes lances na existência, como se fossem fadados a um estágio inferior ou a viverem em classes destinadas a permanecerem num plano secundário. Por outro lado, há o risco permanente de jogar todo mundo numa competição terrível, com a qual também se gera insatisfação, tristeza e revolta. A própria exposição de modelos de vida, através dos grandes meios de comunicação, suscita sonhos tantas vezes irrealizáveis, fúteis e supérfluos. Por falar em coisas supérfluas, vale a pena rever as gavetas de nossas casas ou de corações, sejamos ricos ou pobres, para verificar quanta coisa está sendo guardada sem sentido, às vezes com a desculpa de que um dia poderá servir! É hora de arrumar a casa! É tempo de redescobrir ideais mais consistentes e ajudar-nos mutuamente a procurá-los!
Há uma canção muito divulgada, cujo conteúdo reflete a força e a riqueza da Palavra de Deus nas parábolas contadas por Jesus (Cf. Mt 13,44-52) e orienta nossa reflexão: “Tu me deste um tesouro, brilha mais do que o sol. Não, ninguém mais o levará, porque está dentro de mim. Nada era o que eu tinha, como um nada passou, tudo, tudo deixei, porque não me falava de ti. Tu és meu grande tesouro, tu que me deste o amor. Vivo e sempre reencontro no amor a alegria, de me libertar. Já em ti me perdi, minha vida te dei, mas eu seu que a encontrarei lá onde está o meu tesouro” (O tesouro – Movimento dos Focolares).
Existe um tesouro pelo qual vale a pena gastar todas as energias. O Evangelho fala de “procurar” e de “encontrar”! Que linguagem atraente, com tesouro e pérola preciosa! Este tesouro brilha e atrai. É questão de escolha, opção de vida que orienta todas as capacidades humanas. É conversão acreditar que não estamos no mundo por acaso ou condenados a viver sem sentido. Fomos pensados e amados por Deus desde toda a eternidade para sermos felizes e realizados. No mais profundo de nosso ser, está inscrito um plano que é feito de amor pelo amor do próprio Deus, não como um destino pesado, mas uma aventura de amor. Ele é um tesouro e está dentro de nós e não distante. O apelo da Palavra é buscar, perguntar, ir atrás, não desanimar, insistir! Mais ainda: o próprio Deus é o tesouro!
Quem encontrou o tesouro, a pérola preciosa, experimenta, como o personagem da parábola, uma grande alegria. Para possuir tal tesouro, quem o encontrou dá tudo o que tem, porque entende a beleza do que possuirá. O outro também por causa de uma pérola, que representa algo de muito precioso, vende tudo o que tem para possuí-la. Por causa do Reino dos Céus, também nós somos chamados a deixar tudo o que não fala de Deus, perder tudo o que vale menos do que ele, para experimentar a alegria de nos libertamos com aquela liberdade que só pode vir de Deus, entregando por Ele a nossa vida.
Há poucos dias, a Liturgia nos oferecia a celebração da Festa de Santa Maria Madalena, “Apóstola dos Apóstolos”. Dela, dizia São Gregório Magno: “Procurava a quem não encontrara, chorava enquanto buscava e, abrasada no fogo do seu amor, sentia a ardente saudade daquele que julgava ter sido roubado. Por isso, só ela o viu então, porque só ela o ficou procurando. Na verdade, a eficácia das boas obras está na perseverança, como afirma também a voz da Verdade: “Quem perseverar até o fim, esse será salvo” (Mt 10, 22). Ela começou a procurar e não encontrou nada; continuou a procurar, e conseguiu encontrar. Os desejos foram aumentando com a espera, e fizeram com que chegasse a encontrar. Pois os desejos santos crescem com a demora; mas se diminuem com o adiamento, não são desejos autênticos. Quem experimentou este amor ardente, pôde alcançar a verdade”. Somos chamados à mesma aventura, tendo encontrado o tesouro!
Algumas consequências, com a ajuda que a Palavra de Deus nos oferece. Aprender a relativizar os problemas pode ser o começo. Esquentar a cabeça não resolve nada! Comecemos por olhar ao nosso redor, pois encontraremos muitas luzes que chegam pelas experiências das outras pessoas. Podemos ainda recordar situações semelhantes, nas quais soubemos “dar a volta por cima” e continuar a caminhada. Depois, diante das pessoas e dos desafios da vida, ter a certeza de que trazemos dentro de nós um tesouro que dá sentido à nossa existência. Não nos tornemos esmoleres que suplicam a cada momento atenções e compensações, mas tornemo-nos companheiros e irmãos na luta, junto com todas as pessoas que encontrarmos. E às outras pessoas, é hora de aprender a oferecer o que temos de melhor, e sabemos que não é pouco, ao invés de fazermos coro às lamentações correntes, cujo efeito é sempre um derrotismo destruidor. A certeza da vitória que vence o mundo, a nossa fé, nos alimente na sede pelo Reino de Deus e na coragem para levar o tesouro recebido a todas as pessoas que encontramos.
Diante de um mundo cujo sentido da vida se esgota a cada momento, temos a certeza de poder oferecer a única realidade que não passa e não pode ser destruída por qualquer ameaça que seja, e esta realidade é Deus!
Fonte:CNBB

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