terça-feira, 31 de março de 2015

Aleluia

Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará (PA)

Os evangelhos foram escritos “de trás para frente”, pois a primeira notícia que correu o mundo é a da Ressurreição do Senhor e à luz do acontecimento pascal é que todas as outras narrativas evangélicas foram feitas. Proclamar que Jesus Cristo morreu e ressuscitou, ele é o Senhor e há de voltar para julgar os vivos e os mortos é suficiente para abrir os corações das pessoas e acender neles a certeza da vida verdadeira. Repete-se de diversas formas o diálogo de Pedro com a multidão, na manhã gloriosa de Pentecostes, quando a Igreja saiu à vida pública: “Que todo o povo de Israel reconheça com plena certeza: Deus constituiu Senhor e Cristo a este Jesus que vós crucificastes”. Quando ouviram isso, ficaram com o coração compungido e perguntaram a Pedro e aos outros apóstolos: ‘Irmãos, que devemos fazer?’ Pedro respondeu: ‘Convertei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para o perdão dos vossos pecados. E recebereis o dom do Espírito Santo’” (At 2, 36-38). E assim acontecerá em cada recanto onde chegar a Boa Nova. É verdade!

Na mesma luz os acontecimentos da história do mundo e da vida das pessoas encontram no Senhor Jesus morto e ressuscitado a resposta às suas grandes interrogações e se vislumbra seu sentido mais profundo. Em primeiro lugar a própria vida, quando tocada pela pergunta fundamental a respeito da existência de cada um de nós neste mundo. Fomos pensados por Deus desde toda a eternidade, para participar da vida plena que nos é dada em Jesus Cristo, por quem tudo foi criado. Vale a pena vir a este mundo e nele permanecer, vale a pena percorrer todas as etapas da própria história como uma estrada da felicidade que não terá fim. É verdade!
Consequência é a certeza da vida eterna, que os cristãos professam quando rezam o Credo. E Jesus Cristo no-la promete e dá a garantia, “para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3, 16). A quantos foram a Ele com perguntas sobre a eternidade, respondeu com precisão e lhes indicou as sendas a serem percorridas. Um doutor da lei, que desejava experimentar Jesus, é conduzido ao coração da própria lei, no amor a Deus e ao próximo, quando provocado pelo diálogo com o Senhor, que lhe diz com precisão: “Respondeste corretamente. Faze isso e viverás”. Mas como vida eterna e vida quotidiana lhe pareciam distantes, pergunta mais ainda e recebe como resposta para si e para a humanidade a parábola do bom samaritano. Ao final, parece ressoar um refrão: Então Jesus lhe disse: “Vai e faze tu a mesma coisa” (Cf. Lc 10, 25-37). A vida eterna está ao alcance de todos, e se encontra no amor a Deus e ao próximo. É experimentada no meio das vicissitudes das estradas percorridas pela humanidade. É verdade!
Como na luz do Senhor vemos a luz (Cf. Sl 35, 10), todos os acontecimentos encontram nele seu sentido. As notícias de desastres, violências, crimes, maldade de todo tipo, ao invés de nos provocarem apenas com as costumeiras reações emocionais diante dos escândalos, suscitam em nós o clamor pelo amor e pelo serviço ao próximo, por termos a certeza que aqui está a estrada da vida verdadeira. O mundo pode ser diferente se Jesus Cristo for acolhido como Senhor! Se porventura caem ao nosso lado um à direita e outro à esquerda, esta não será a última palavra nem o desastre final, pois a avassaladora força do pecado não é um destino cego para a humanidade! Esta foi feita para a vida e lhe cabe semear a vida. Nasce em torno de cada cristão uma energia indestrutível para recomeçar sempre, buscar caminhos, criar soluções diferentes para os problemas, pois sua fé no Cristo ressuscitado o faz incorrigível na esperança. É verdade!
Uma vez, o Senhor encontrou uma mulher samaritana, com todos os qualificativos negativos existentes em seu tempo. À beira de um poço, como os tantos de nossa vida, entabula-se o conhecido diálogo, em cujo núcleo se encontra justamente o argumento de uma vida eterna: “Todo o que beber desta água, terá sede de novo; mas quem beber da água que eu darei, nunca mais terá sede, porque a água que eu darei se tornará nele uma fonte de água jorrando para a vida eterna” (Jo 4, 13-15). A vida eterna é alguém que tem sede da fé, justamente diante de uma mulher com uma vida atrapalhada. Sim, as inúmeras situações pessoais carregadas de passos dados numa direção errada podem ser confrontadas com o Senhor que, ressuscitado, continua assentando-se à beira de tantos poços, conversando com todas as sucessivas gerações de homens e mulheres, cansados dos próprios trabalhos ou de seus passos mal dados. É verdade!
Algumas vezes são os limites físicos, emocionais ou morais que nos abatem. A experiência de fé em Cristo ressuscitado, feita por São Paulo nos leva a repetir com ele, “Não desanimamos. Mesmo se o nosso físico vai se arruinando, o nosso interior, pelo contrário, vai-se renovando dia a dia. Com efeito, a insignificância de uma tribulação momentânea acarreta para nós um volume incomensurável e eterno de glória. Isto acontece, porque miramos às coisas invisíveis e não às visíveis. Pois o que é visível é passageiro, mas o que é invisível é eterno” (2 Cor 4, 16-17). É verdade!
Os discípulos de Jesus, reunidos e temerosos, após os acontecimentos da paixão, precisaram de uma aparição do Senhor para acreditarem: “Naquela mesma hora, levantaram-se e voltaram para Jerusalém, onde encontraram reunidos os Onze e os outros discípulos. E estes confirmaram: ‘Realmente, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão!’ Então os dois contaram o que tinha acontecido no caminho, e como o tinham reconhecido ao partir o pão” (Lc 24, 33-35). É verdade!
Passado o tempo das aparições, o que resta para o mundo e para os cristãos, até que ele venha? De um lado, a riqueza do testemunho daqueles que, tendo-o visto, anunciaram a verdade que chegou até nós. Por outro lado, sabemos que o Senhor ofereceu como alimento para a jornada da vida a sua presença, vida eterna à disposição de quem dele se aproximar: “Quem se alimenta com a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6, 54). Não se trata se uma promessa longínqua, mas de uma qualidade de vida a ser desfrutada hoje! Todos os dias, até o fim dos tempos, em algum lugar do mundo é Páscoa, é Ressurreição, é vida nova, onde houver cristãos reunidos em torno do altar da Eucaristia. Reconhecê-lo, alimentar-nos de sua presença, é a fonte de eternidade para nós e para todos os que consumarem nosso tempo e nosso amor fraterno. É verdade!
Assim os cristãos podem cantar, mais uma vez, o aleluia pascal. Nova vida, nova esperança, santa Páscoa para todos.
Fonte: CNBB

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