2013-09-17 L’Osservatore Romano
O olhar misericordioso de Jesus ampara o sacerdote na canseira diária da sua missão. É assim, há sessenta anos, para Jorge Mario Bergoglio. Tendo-se tornado bispo de Roma há seis meses, na manhã de 16 de Setembro realizou um passo decisivo para entrar no coração da sua diocese. Na basílica de São João de Latrão, catedral de Roma, o Papa Francisco dialogou prolongadamente com o seu clero.
«Sinto-me sacerdote» confidenciou. E repercorrendo também as suas experiências pessoais em Buenos Aires, revelou que nunca teve a tentação de se sentir mais importante desde que é Papa. Ao clero romano pediu sobretudo que reze por ele. Principalmente a 21 de Setembro, festa de são Mateus. Porque naquele dia, há sessenta anos, descobriu a vocação para o sacerdócio.
Na primeira parte do encontro – introduzido peloVeni creator Spiritus e por um trecho do evangelho de João o Papa falou antes de tudo da boa canseira do sacerdote pela missão no meio do povo. Ser sacerdote, garantiu, significa trabalhar muito, porque o povo tem hoje como nunca teve muitas exigências. E a sensação das canseiras, acrescentou, inclui para o sacerdote também perguntas fortes sobre si mesmo, sobre a bondade da própria vocação e sobre as renúncias que ela comporta, primeira de todas a paternidade biológica. Mas é uma canseira que o sacerdote vive e supera com todo o seu ser. Entre os vários exemplos bíblicos aos quais se referiu, o bispo de Roma indicou sobretudo Maria que, como dizia João Paulo II, tinha uma «peculiar fadiga do coração». De resto, a oração e a proximidade aos outros, a partir do próprio bispo, são para o sacerdote um antídoto eficaz nos momentos de maior canseira.
O Papa Francisco respondeu depois às perguntas de cinco representantes do clero romano, enfrentando juntamente com eles algumas questões centrais na vida da Igreja. Convidou imediatamente os sacerdotes a serem corajosos, a terem uma justa criatividade, que não significa fazer algo por força, para chegar à necessária conversão pastoral. As paróquias, recomendou, devem estar sempre abertas e ser acolhedoras, possivelmente com o confessor à disposição. Também os leigos que se ocupam da administração devem mostrar ao povo o rosto acolhedor da Igreja. Trata-se, em grande medida, de encontrar sempre caminhos novos para que o Evangelho seja anunciado e testemunhado nas realidades da vida diária. Assim é importante procurar vias novas, apropriadas e adequadas às pessoas às quais nos dirigimos: por exemplo, facilitando a participação nos cursos pré-baptismais e comprometendo os leigos na missão do bairro. Numa cidade grande como Roma, reconheceu o Pontífice, o acolhimento cordial nem sempre é fácil de organizar. Mas as pessoas, frisou com vigor, nunca devem ter a impressão de se encontrarem diante de funcionários com interesses económicos e não espirituais.
O bispo de Roma sugeriu depois que se mantenha viva a memória do nascimento da própria vocação, do primeiro amor a Jesus: é o sentimento próprio de um apaixonado, e o sacerdote deve tê-lo sempre. Uma igreja sem memória, não tem vida. Precisamente este estilo de memória contribui também para não cair no risco da mundanidade espiritual.
Outro aspecto decisivo é saber dizer a verdade sem nunca deixar sozinhas as pessoas em dificuldade. Com efeito a verdade de Deus caminha sempre ao passo com o acompanhamento pessoal. Não se trata de ser permissivos ou rígidos: estas não são atitudes misericordiosas. Ao contrário, é preciso acolher o próximo, acompanhá-lo, precisamente como Jesus com os dois discípulos de Emaús.
O Papa Francisco não escondeu os problemas e os escândalos até gravíssimos, como a pedofilia, que envolvem a Igreja. Mas a Igreja não desaba, garantiu respondendo a um sacerdote que na sua intervenção se tinha referido ao sonho de Inocêncio III que viu Francisco de Assis amparar o edifício da Igreja em ruínas. E não desaba porque hoje, como sempre, há tanta santidade quotidiana: há muitas mulheres e homens que vivem a fé na vida de todos os dias. E a santidade é mais forte do que os escândalos. A este propósito, o Papa contou o diálogo telefónico, que teve no domingo, 15 de Setembro, com uma mulher de Buenos Aires que lhe tinha escrito uma carta num guardanapo de papel. Entregou-a ao Pontífice na sexta-feira, o director da televisão católica da arquidiocese de Buenos Aires. A mulher, que se ocupa da limpeza no aeroporto da capital argentina, tem um filho toxicodependente e desempregado. E trabalha para ele, tendo esperança no futuro do jovem. Esta é santidade, comentou o Papa.
O encontro concluiu-se com três perguntas sobre as periferias existenciais. Antes de tudo, o Papa repetiu as palavras pronunciadas no centro Astalli, elogiando a generosidade de Roma mas encorajando a fazer ainda mais. E às congregações religiosas que têm poucas vocações voltou a recomendar que não caiam na tentação de se apegarem ao dinheiro mas que tenham a coragem de abrir as portas aos necessitados.
Além disso para o Pontífice a realidade compreende-se melhor da periferia e não do centro que, ao contrário, faz correr o risco de se atrofiar. E as periferias não são só as geográficas. Por fim, o bispo de Roma concluiu o encontro enfrentando as questões relativas à nulidade do matrimónio, um tema pelo qual Bento XVI se preocupa. E deu a conhecer que estão a ser feitas propostas, estudos e aprofundamentos. Disto falarão em Outubro o grupo dos oito cardeais e o próximo sínodo dos Bispos. Estas situações, acrescentou, são uma verdadeira periferia existencial que exige coragem pastoral, sempre na verdade e na justiça.
Quem recebeu o Papa à sua chegada, vinte minutos antes do previsto, foi o cardeal vigário Agostino Vallini, o qual na saudação que lhe dirigiu recordou que este encontro tinha sido programado pelo novo bispo de Roma logo que foi eleito. A diocese ofereceu ao seu bispo um ícone que representa são Francisco que ampara a Igreja, obra do pároco Massimo Tellan. No final, antes de regressar ao Vaticano depois de mais de duas horas, o Pontífice encontrou-se com os frades menores que desempenham o seu ministério de penitencieiros na basílica-catedral de Roma. E convidou-os a ser misericordiosos.
Fonte: News.VA
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