quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Um Conto Natalino


UM CONTO NATALINO

Três palhaços cabeludos e magros saltaram do opala preto de vidros escurecidos por película, quando três crianças também magras subiam a rua íngreme da creche Lar Abílio de Souza. Os palhaços já estavam prontos para o espetáculo que abrangia números circenses, tais como malabarismos, acrobacias e palhaçadas, é claro. Pararam por um instante para terminar um cigarro que dividiam. Olharam de relance para as crianças que chegavam diante do portão da secretaria da instituição e foram ter com a diretora, que lhes fez o pagamento adiantado. Coisa pouca. Cachê minguado. Algo que certamente consumiriam em algumas cervejas na noite que sucederia à manhã do espetáculo.
O carro da empresa de bens alimentícios Flábio Brasil Ltda. estacionou logo atrás do opala dos palhaços. Trazia alguns brinquedos e alguns doces, os quais seriam entregues pelos funcionários colaboradores do projeto Natal Melhor. Algo que a empresa praticava como parte de uma política de assistência e melhoria da qualidade de vida dos indivíduos da comunidade na qual estava instalada. A diretora fora recepcionar o pessoal da empresa à porta da instituição. Os recebeu com sorrisos e afabilidade. A criança maior das três aproveitou o ensejo e se aproximou da diretora que parecia conhecê-la. Afastaram-se por dois ou três passos, conversaram, e no instante seguinte a criança maior se despedia da menor, e esta ia para dentro do estabelecimento. Era uma menininha de pele morena e longos cabelos de corte irregular e embaraçados. Deveria ter no máximo quatro anos de idade.
A criança maior tomou a do meio pela mão e ambas voltaram ladeira abaixo com a mesma resignação com que haviam subido.
No pátio da creche, os palhaços envolveram completamente a massa infantil, que de suas pequenas cadeiras parecia hipnotizada. Nessa altura dos acontecimentos seria impossível destacar a criança que fora introduzida de última hora ao grupo, por um pedido da suposta irmã mais velha à porta da instituição, se não fosse por algo muito peculiar que atraiu para ela a atenção das pessoas envolvidas na organização da ação.
Após uma hora e meia de palhaçadas as crianças receberam balas que eram atiradas aos punhados. Coloridas, macias e perfumadas, causaram alvoroço na pequena multidão. As crianças ficaram com as mãos e com a boca cheia por falta de bolsos. Em seguida, um Papai Noel bastante magro distribuiu modestos brinquedos, todos muito bem embalados. Uma boneca para cada menina e um caminhãozinho para cada menino. As crianças foram instruídas a não tirá-los da embalagem ali, a fim de evitar transtornos por uma eventual destruição precoce.
A pequenina mais uma vez fugiu à regra. Fez com o dedo indicador um pequeno furo no plástico da frente da caixa, e por esta abertura introduziu uma a uma cada bala que havia angariado na disputa. Depois dos brinquedos vieram os pirulitos. Aos quais a pequenina deu o mesmo destino das balas. E por fim, o encerramento triunfal. Picolés servidos pelas monitoras que faziam a vez de auxiliares de Papai Noel. E adivinhe o que foi que a pequenina fez do picolé que recebeu. Sim. Introduziu na caixa. Uma monitora já havia percebido que ela nada comia e a tudo armazenava. Então se aproximou e teve confirmada a suspeita. Deu ordem para a menina retirar o picolé da caixa e consumir naquela hora. Ordem cumprida...
A pequenina chorava com o picolé derretendo e pingando ao solo. O pessoal da empresa se aproximou a fim de persuadi-la e confortá-la. Contudo ela apenas razoavelmente recobrou a calma diante da promessa de que seriam entregues picolés também para os seus irmãos na hora em que chegassem para buscá-la. Fim de festa. Crianças à porta. Cumprido o trato. Uma pessoa da empresa ficou curiosa quando percebeu que ao invés de desembalar os picolés e caminharem enquanto sorviam, as crianças os levavam inviolados ladeira abaixo.
Uma das colaboradoras olhou para a diretora do estabelecimento com cara de interrogação. Então a diretora disse que não haveria picolés que bastassem. Afinal eram tantos os irmãos famintos que aguardavam em casa. .( POR JÉFERSON CARDOSO)

2 comentários:

  1. Ceiça, obrigado pelo carinho da lembrança! É muito gratificante reencontrar este escrito já de tanto tempo passado aqui em um dos meus blogs preferidos. Beijo e que o clima de Natal nos guie pelos caminhos que agradam o Senhor.

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  2. Olá Jeferson! Você não tem nada a agradecer,eu é que te agradeço por escrever tão lindos textos! Tenho enorme prazer de postar seus escritos que são compatíveis ao Caminhar na Missão.Um forte abraço amigo! Obrigada por seu carinho! Deus te abençoe e te ilumine!

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